quinta-feira, 14 de julho de 2011

Beth Carvalho – O Samba agradece as bênçãos da madrinha

Entra as muitas pessoas que fazem bem ao samba, a carioca Beth Carvalho é uma delas. E sua volta aos palcos no início deste 2011, após um ano e meio se recuperando de problemas de saúde, é de grande importância. Não só por estar melhor a cada dia mas pelo valor de sua trajetória musical, que está completando 45 anos. E nesse tempo a botafoguense Elizabeth Santos Leal de Carvalho, nascida na Gamboa, fez por merecer ter entrado para a galeria dos grandes nomes do samba. Para isso, o simples fato de ter pisado na quadra do Bloco Cacique de Ramos numa das célebres noites de quarta-feira, acreditado na arte de Bira Presidente, Ubirany, Sereno, Neoci, Almir Guineto, Jorge Aragão, Sombrinha e os levado para o estúdio, já seria um gol de placa. Era o som que mudaria e modernizaria o nosso samba. Com banjo, tantan, repique de mão e uma nova forma de cantar, compor e tocar o samba, sob as bênçãos da madrinha Beth Carvalho.

Mas a revolucionária Beth fez mais nesses seus 45 anos de estrada. Sua chegada nos bons pagodes que infestam nosso país é sempre um acontecimento. É um tal de todo mundo querer tocar melhor, cantar samba novo, uma loucura. Um evento. Basta a “mulher” ou a “Carvalho” chegar na área. Era assim, por exemplo, que vários compositores a chamavam nos anos 80. Era uma ótima fase de gravação de discos e gravar com a Beth significava uma boa grana de advance (aquele adiantamento que o compositor recebe na editora ao gravar sua composição). Até porque é uma boa vendedora de discos.



Beth também tem revelado muitos compositores. Fora os já citados, da primeira formação do Fundo de
Quintal, tem nomes até então ilustres desconhecidos do grande público como Dida, Dedé da Portela, Arlindo Cruz, Luis Carlos da Vila, Zeca Pagodinho, Marquinho PQD, Adílson Bispo, Wanderlei Monteiro, Marquinho de Oswaldo Cruz e tantos outros. Sem contar sua paixão por Cartola e Nelson Cavaquinho, da sua Estação Primeira de Mangueira querida, pela qual desfila desde 1972. E me disse uma vez que são tantos ótimos compositores que nem se preocupa em ser compositora. Mas também já fez e foi gravada por Emílio Santiago (Afina meu Violão) e Lucinha Lins (Acalanto para Luana). Pela banda que acompanha, por exemplo, já passaram feras como Neco, Mauro Diniz, Gordinho, Valtinho, Marcelinho Moreira, Mauro Braga, Telma Tavares, Juca, Elizeu, Claumir Gomes, Luca (com certeza esqueci de alguém) e hoje mantém outros craques no time, formado por Márcio Vanderlei (cavaco), Charlles da Costa (violão de 6), Carlinhos 7 Cordas (violão de 7), Dirceu Leite (sopro), Jorge Gomes (bateria), Tcha-Tcha-Tcha (surdo),
Beloba (tantan), Marcelo Pizzot (repique de mão) e Pirulito (percussão).


E por aí veio a menina que sonhava em ser bailarina do Teatro Municipal. Chegou a ser a primeira bailarina
da sua academia. Mas acabou mesmo foi dizendo no pé, miudinho. Trocando as teclas do piano pelas cordas do vilão e do cavaquinho, seguindo os passos da avó piauiense, que tocava violão, bandolim e realizava famosos saraus em sua casa. A neta também tornou-se uma festeira. E sorte daqueles que já estiveram num bom pagode na bela casa que morou no Joá. Lembro de uma vez em que dirigi um show do Fundo de Quintal no Asa Branca. Após o show fomos todos para dar parabéns à madrinha. Era seu aniversário. Os instrumentos ficaram no camarim. Mas a esperta Beth colocou cavaco, banjo, tantan, pandeiro, repique de mão em cima da mesa e disse: “Bem, meus afilhados, a festa está pronta. E a
chave da casa comigo”. É claro que o pagode rolou até o dia raiar, em plena madrugada de uma quinta-feira.

Assim é a festeira Beth Carvalho. A Betinha, como é chamada por seu maestro preferido, Ivan Paulo. A
politizada botafoguense que adora uma boa rabada com agrião e que em pequena, apesar de criada na
zona sul, já sentia os ares do subúrbio indo de trem para Marechal Hermes e Realengo, com a mãe. A
primeira sambista a receber, em novembro de 2009, na noite da décima edição Grammy Latino, o prêmio Life Achievemente Awards (Conquista de Toda uma Vida), em reconhecimento à sua obra. Para este ano a promessa de um cd com sambas inéditos dos mais importantes compositores do samba. É o Brasileiríssima, que traz de volta a assinatura do produtor Rildo Hora, que esteve a frente de tantos discos de sucesso da cantora.


Que Beth continue seguindo sua trajetória na convivência com bons músicos, compositores e seu afinado bom gosto para repertório e o faro aguçado para o sucesso. Ah, e vale a pena adquirir o CD Muito na Onda, do Conjunto 3D. Entre os integrantes, Antonio Adolfo, Eduardo Conde e a jovem Beth Carvalho. O disco é de 1967. Na contra-capa um texto de Sérgio Malta diz assim: “Beth é aquela coisinha linda que vem se apresentando em algumas das principais emissoras de TV do Rio e São Paulo. Canta gostoso à beça...”.
No repertório, quando nem pensava em ir ao Cacique de Ramos, Beth canta bonito Roda (Gilberto Gil/João
Augusto), I´ve Got you Under my Skin (Porter), Night and Day (Cole Porter). Ouça.

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