sexta-feira, 26 de maio de 2006

Madame Satã

Em 1900 nasceu, em Pernambuco, João Francisco dos Santos – que na década de 20, foi conhecido como Madame Satã, o malandro mais famoso da Lapa.

João chegou ao Rio com nove anos de idade e foi morar na rua Sacadura Cabral, até que um dia cismou de fugir de casa, quando foi morar na rua Morais e Vale, n° 27, na Lapa – bairro pelo qual se apaixonou desde o primeiro dia.

"Para mim a Lapa é quase como minha mãe, minha pátria. Eu adoro aquele pedacinho de terra. Ali foi onde eu encontrei todo o meu apoio na vida (...)"

João foi crescendo na Lapa e foi por volta de 1918 que começou a freqüentar as rodas da malandragem, ainda sem ser Madame satã – apelido que ganhou depois de se exibir vestido de diabo em um baile do Teatro da República.

Seu primeiro processo foi em 1928, acusado de assassinar um guarda em um botequim na rua Mem de Sá. Segundo Satã, ele atirou no guarda sim, mas a vítima foi cambaleando para rua, caiu e bateu com a cabeça na calçada. “Foi a calçada (que o matou), não foi a bala não”.

Satã passou, ao todo, 27 anos e oito meses (intercalados) preso. Segundo sua ficha penal no IFP, respondeu a 26 processos (13 agressões, 4 resistências à prisão, 3 desacatos, 2 receptações de furto, 2 furtos, 1 ultraje público ao pudor e 1 porte de arma).

“Se eu nascesse de novo não ia levar a vida que levei. Ia viver de acordo com a sociedade, se bem que 99 por cento da sociedade é mais porca do que eu, é pior do que eu porque é hipócrita, mentirosa, falsa. Eu não acredito muito na sociedade não. Eu prefiro mais um cão do que um homem (...)”.

Mesmo vivendo mais de 25 por cento de sua vida preso em Ilha Grande, no antigo presídio conhecido como Colônia Correncial Três Rios, Madame satã criou cinco filhos junto de sua companheira Maria Faissal Iapu, com quem viveu por quase 30 anos.

João Francisco dos Santos morreu em 1976, no hospital de Ipanema, perdendo sua última briga contra o câncer. “A vida me ensinou tudo no mundo. Eu na vida aprendi tudo. Só não aprendi a roubar, a ser toxicômano e a ser guia de cego. Esses flagrantes de furto que eu tenho são todos forjados."

"Aprendi a ser bom, aprendi a ser mal, aprendi a ser amigo e ser inimigo. Também aprendi a ser falso um pouco. Quando eu quero ser eu também sou falso porque sei ser. Aprendi a cozinhar, a lavar, a passar e costurar. Aprendi a ser bom amigo, bom pai, bom filho e bom irmão. Aprendi a ser brigão. Mas também é porque me provocam. Como é que hoje eu não brigo com ninguém? Ninguém me provoca (...)"

"Eu não quero mais nada na vida. Eu espero que Deus me ajude, ilumine meu anjo da guarda com a proteção dos meus velhos que são Benedito e meu pai Francisco. Em primeiro lugar Oxalá, meu pai. Em segundo lugar meus velhos, meus Exus, Maria Arrepiada e Rosa Sapucaia. Espero que eles me defendam de tudo o quanto foi perseguição dos meus inimigos. Espero que eu possa terminar os meus dias de vida em paz e ter bastante calma”.

Madame Satã.

*Declarações tiradas da última entrevista de Madame Satã concedida ao jornal Pasquim, em 1976.
Ref: Pasquim,1976, período 30/04 a 06/05, ano VII, n° 357.


Lavilha Sá

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