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sexta-feira, 27 de julho de 2012
Jovenílson e Mariah Carey – loucuras de um fã - PARTE III
Hoje termino a história do Jove e da Mariah! A história do fã enlouquecido pela cantora Mariah Carey. E depois de contar como começou esta idolatria, este amor e de saber de algumas das loucuras que o Jove tem feito para chegar perto de sua musa, o teste final é ver se ele conhece mesmo sua estrela ou se gosta só de aparecer a seu lado. E não é que ele sabe mesmo? Basta dar uma tradicional “fuçada” no Orkut do Jovenílson e descobrir um monte sobre a cantora norte-americana, nascida a 27 de março de 1970, em Nova York. Ele sabe cada detalhe da sua musa, que é capaz dela esquecer de um deles. Ou seja, se você um dia for entrevistá-la dá uma “espiadinha” e verá as mais variadas informações constantemente atualizadas na página do Jove. Aliás, quando você estiver lendo esta coluna pode ser que o número de álbuns, fotos e as informações já tenham aumentado.
Mas vamos ver o que descobri sobre a Mariah: conheci a tradução da canção Can`t That Away. E que Mariah é filha de mãe irlandesa cantora de ópera, pai venezuelano e tem dois irmãos. Ela adora macarrão e salada, filmes de comédia e terror, é fã de Aretha Franklin, Stevie Wonder, Marilyn Monroe e James Dean. Gosta de tocar piano, nadar, andar de montanha russa e suas cores preferidas são rosa e preto. E que seu nome surgiu depois de sua mão Patrícia Hickey, ouvir a canção They Call Mariah, do musical Paint Your Wagon. E que despertou para a música aos dois anos de idade, ao surpreender sua mãe cantando trechos de suas óperas favoritas. Aos seis anos já escrevia poesias e durante o colegial estava determinada a se tornar uma cantora. Sem se preocupar com as aulas no dia seguinte, todas as noites ela ia para Manhatan se encontrar com músicos. E as constantes faltas no colégio lhe renderam o apelido de Mirage.
Fiquei sabendo, entre outros recordes, que Mariah é uma das cantoras mais premiadas da história: recebeu mais de 250 prêmios, incluindo 5 Grammys, 1 Oscar e 1 Globo de Ouro e o Prêmio World Music Awards como a cantora mais bem sucedida em vendas nos seus 15 CDs, com mais de 180 milhões de álbuns vendidos pelo mundo. Que recebeu 39 indicações ao Grammy, com cinco vitórias. Que é a única artista a ficar em primeiro e segundo lugar da parada de sucesso simultaneamente. E que sua amplitude vocal vai de 5 a 8 oitavas.
E que está casada desde abril de 2008 com o ator, apresentador, diretor e rapper Nick Cannon. Isso após se divorciar, na primavera de 1997, de Tommy Mottolla, com quem esteve casada por quatro anos. E se você pensa que o apaixonado Jove tem ciúmes de sua musa, está enganado. Ele dá é a maior força à união do casal e mostra um montão de fotos de Mariah e Nick. Do casamento às férias na praia, incluindo presentes que Mimi (assim que ele a chama) recebe do marido. E que ela é a mamãe de gêmeos que nasceram em 30 de abril de 2011, dia em que ela completa aniversário de casamento com o marido Nick.
Por sua vez, Jove a chama também de My Life e cria expressões como maraiahvilhosa e abraços careyosos, além de um buddy poke seu com Mariah, no orkut. E não satisfeito com tanta foto de sua grande paixão, que afirma ser sua analista e terapeuta, colocou a foto do arroz Mariah num dos álbuns. Só que a pronúncia certa é Mariá. É mole?: “Mariah é a melhor cantora de todos os tempos. Ela é humilde, se importa com os fãs e o principal é que eu a amo acima de tudo e de todas as pessoas”, afirma o louco fã.
“E no meu Orkut coloquei uma versão, com muito respeito, da Ave Maria e da Santa Maria, em homenagem à minha idolatrada Mariah Carey: Santa Mariah que estais no palco/Santificados sejam vossos agudos/ Venha a nós o seu cd novo/Seja feita a vossa vendagem/ Assim no Brasil como em todos os lugares do mundo/ A apresentação nossa de cada dia nos dai hoje/Perdoai as nossas críticas/Assim como nós perdoamos os vossos playbacks/E não nos deixei gostar de outra cantora/E nos livrai de Madonna/A-a-A-a-A-mééééééééééém. E a Ave Maria: Ave Mariah cheia de Graça/Nós estamos sempre convosco/Bendita sua voz entre as das outras cantoras/ Bendito o fruto das suas cordas vocais agudos ou então Ave Mariah cheia de graça/Lembrai de nós pelo Amor de Lord/E venha com a "Turnê" pro Brasil/Antes da hora”.
Este é o Jovenílson da Cidade de Deus. Um fã alucinado pela cantora Mariah Carey, que reza com todo fervor para que sua musa coloque o Brasil no roteiro de sua próxima tournée de lançamento do novo cd, previsto para sair em setembro próximo, ou seja, aguardem para 2013 mais uma nova série de loucuras do Jove por Mariah...
Marcos Salles
quinta-feira, 19 de julho de 2012
Jovenílson e Mariah Carey – Loucuras de um fã – PARTE II
Fico aqui imaginando numa cena digna de programas como, por exemplo, o Caldeirão do Huck: Uma noite de festa na Cidade de Deus, ali no famoso conjunto de prédios, hoje todo colorido. E batem na porta do Jovenílson Firmino da Hora, o alucinado fã de Mariah Carey. E quem bate à porta é a própria cantora. Com certeza uma UTI móvel terá de estar por perto e preparada para socorrer o Jove, pois a surpresa de certo irá deixá-lo fora do ar por um tempo. Bem que o Luciano poderia aprontar mais essa né mesmo? Mas, enquanto a surpresa não vem, vamos ficando com algumas das loucuras que o Jove tem feito por sua musa. E, pra ficar mais emocionante é melhor que ele mesmo diga como foi:
“Em novembro 1999, na primeira vez que minha paixão esteve no Brasil, mesmo correndo o risco de ser demitido eu faltei ao trabalho para vê-la no Domingão do Faustão. Era o lançamento do CD Rainbow. Sem convite, cheguei à porta da emissora às 10:00 e só consegui entrar às 14:30, sem almoço, porque uma caravana não chegou a tempo. Eu trabalhava num restaurante e, quando estava na platéia, tentei me esconder das câmeras, mas estava segurando uma faixa e a turma do trabalho me viu. Foi por pouco”.
“Em dezembro de 2003 minha musa voltou ao Brasil pra lançar o CD Charmbracelet e gravar um acústico no Fantástico. Saí do trabalho direto para o Projac, mas não consegui vê-la. Aí, fui para a porta da boate na Barra da Tijuca onde iria acontecer a festa de lançamento do cd. E fui numa Kombi com mais 16 pessoas. Mais uma vez sem perspectiva nenhuma. Mas o milagre aconteceu. Ela chegou, desceu do carro e veio na minha direção. Fiquei bege e nem tava acreditando. Não pensei duas vezes e tirei uma foto dela. E ainda segurei na sua mão. Meu coração disparou. Com o meu inglês muito do sem- vergonha, disse que a amava e que ela era minha heroína, que era linda, que era tudo pra mim. Tudo isso no meio da confusão de fãs e seguranças, num empurra-empurra que só os astros merecem”.
“Em abril de 2005, numa festa num parque temático, em que o tema era Mariah, esqueci meu medo de altura e andei na montanha russa para ganhar um cd dela. Ganhava quem respondesse as perguntas sobre ela numa montanha russa. Uma loucura total. No final da festa, depois de perturbar um dos organizadores a noite toda, ainda ganhei pôster e um porta-cd, kit do lançamento do cd The Emancipation of Mimi”.
“Em 2006 cheguei a pedir contribuições pela internet, através do Orkut, para poder ir à tournée The Adventures of Mimi. Até minha grande amiga, a cantora Marli Cummings, tentou me ajudar, criando uma comunidade no mesmo site de relacionamento. Mas não conseguimos nenhum centavo”.
“Em 2009 reservei dez dias de minhas férias para seguir Mariah no aeroporto, na porta do hotel e no show. Foram quase 12 horas de espera no Aeroporto Tom Jobim, aqui no Rio, mas valeu a pena. Foi uma honra estar ali no meio de centenas de fãs que gritavam e choravam pela grande Diva da Música Internacional, que retribuía o carinho com acenos e beijos para todos nós. Eu e três fãs de Fortaleza entramos num taxi e seguimos a comitiva da Mariah. Enquanto eles choravam, eu dava ordens para que o motorista não a perdesse de vista. Até que num instante conseguimos emparelhar com o carro dela e a Mariah, ao perceber que éramos fãs, acenou e mandou beijos pra gente. Foi fantástico! Quase passo mal de emoção! E na chegada ao Copacabana Palace, saltei correndo, fiz fotos da minha grande paixão e ainda consegui um autógrafo na capa do cd Memoirs of an Imperfect Angel (Memórias de um Anjo Imperfeito)”.
“Neste show de 2009, assisti ao show de um lugar mais privilegiado do que o lugar que paguei. Depois do show, eu e um grupo de fãs ainda fomos para a porta do hotel para tirar mais fotos, ou seja, uma adoração incansável”.
“Em 2010, para o show que ela fez em Barretos, interior de São Paulo, fiz nova loucura. Junto com outros 70 fãs fui num ônibus, por 12 horas de ida e mais 12 horas de volta. Mimi cantou seus sucessos por quase duas horas e levou a multidão ao desespero. Foi muito lindo, o show de nossas vidas. Quando ela cantou a canção Hero, a Arena de Barretos ficou tomada de balões brancos. Confesso que nem senti o peso do desgaste da viagem, tamanha foi a emoção de ter estado em mais um show da Mariah aqui no Brasil. É bem verdade que durante o show eu quase tive uma dores fortes no peito e só pedia a Papai do Céu que não me levasse naquela hora, naquele momento tão especial. Com o pedido atendido foi só me acalmar e deixar rolar a emoção naquela noite linda e enluarada de 21 de agosto. E, para completar, minha musa disse que a lua estava linda e que havia colocado um vestido de princesa só para cantar para os fãs, já que era assim que nós a fazemos se sentir. Muito fofa, né?”
Valeu, Jove. E semana que vem continuo esta romântica história do caso de amor entre um fã e sua musa.
Marcos Salles
sexta-feira, 13 de julho de 2012
Jovenílson e Mariah Carey – Loucuras de um fã
A Lapa boêmia dos bons malandros, dos poetas dos bares, das brigas e conquistas de Madame Satã, das serestas e serenatas, vive nos dias de hoje a pluralidade de sons por suas ruas. Ao lado do samba pode-se ouvir praticamente de tudo na Lapa. Da música afro ao rock pesado, da música eletrônica ao rap. Tudo sem o menor preconceito. O importante é cantar, é dançar é a pura expressão da diversão. Daí que lembrei de uma boa história de fã. De um apaixonado por uma cantora que vive bem longe dele, mas que no seu coração mora bem ali ao lado. E aí pensei em como nasce a paixão de um fã por seu ídolo? Quais as explicações para tamanha devoção? Que loucuras uma pessoa é capaz de fazer para estar perto de sua grande paixão? Perguntas como estas muitas vezes são difíceis de responder ou então nos trazem certas respostas nunca pensadas. E, dentre muitos exemplos, fico hoje com um fã que vem da Cidade de Deus, em Jacarepaguá, zona oeste do Rio de Janeiro. Seu nome? Jovenílson Firmino da
Hora. Seu ídolo? Mariah Carey. Poderia chamá-lo de um fã apaixonado pela cantora norte-americana, mas como ele mesmo diz, é mais que isso, ele é “louco por Mariah Carey”. Tão louco que traz na cabeça as iniciais de sua musa e se perfuma com as onze colônias da coleção Mariah Carey.
Hoje com 36 anos de idade, se orgulha de uma adoração que começou aos 17, quando ouviu a canção I`ll Be There num programa de rádio. Foi amor à primeira vista ou à primeira música. Com uma colega do colégio conseguiu emprestado o segundo CD de Mariah, Emotion, e gravou numa fita cassete para ouvir direto. Sem parar. Começou então a colecionar tudo sobre a cantora. Tem todos os CDs, DVDs e filmes e revistas e posters e muitos vídeos, uffa! Caramba, mas é muito material, além das camisetas que manda fazer para eventos sobre Mariah.
Para este louco por Mariah, falar sobre ela o deixa tão nervoso que nem sabe explicar direito o que a musa representa para ele. A verdade é que as canções que interpreta e são sucesso no mundo todo mexem muito com Jove, principalmente as baladas românticas, como Love Takes Time, I Don´t Wanna Cry e I Stay in Love, além das canções gospel e de auto ajuda, como Hero e Can´t Take That Away, que falam de nunca desistir dos sonhos e ideais e que se você olhar para dentro de si, verá que existe um herói dentro de você. “Costumo dizer que Mariah Carey é a minha heroína, minha paixão, minha inspiradora. A mulher da minha vida”, afirma emocionado.
É mesmo muito impressionante sua dedicação. Sem dúvida que Jovenílson é um dos
maiores Lambs que Mariah possui. Lamb significa carneirinho e é como a cantora chama
carinhosamente seus fãs. E, como não poderia deixar de ser, ele criou uma página no Orkut só para os fãs de sua paixão, com quase 4.500 fotos de Mariah, em 58 álbuns nas mais diversas situações, além de vídeos e notícias sempre atualizadas. Também já criou 13 comunidades como Mariah Terapia eu Faço, Ouço e Assisto sempre Mariah Carey e Mariah Carey no Brasil eu Vi e já está providenciando levá-las para o Facebook, que por sua vez já colocou 500 fotos em 10 álbuns.
Pensa que acabou? Que nada. No próximo capítulo começo a contar as loucuras que Jove costuma fazer para se encontrar com Mariah e algumas curiosidades que ele sabe de sua cantora preferida.
Marcos Salles
terça-feira, 12 de junho de 2012
Tia Doca – A saudade da pastora da Portela
No início de 82, ou seja, há pouco mais de trinta anos, fui convidado pelo Mauro Diniz para
ir ao seu pagode, em Oswaldo Cruz. Era uma tarde de sábado. Eu morava ali ao lado, em
Madureira. Na primeira informação que pedi veio a dica: “olha, meu filho, fala com aquela
senhora ali, porque ela sabe tudo de samba e mora aqui há anos”. Fui então perguntar à antiga moradora aonde que ficava o Pagode da Beira do Rio, que era organizado pelo Mauro, por seu parceiro, o também compositor Adílson Victor e pelo amigo Cabral, dono do terreno. E a jovem senhora me ensinou como chegar. Lembro que no final ela me disse: “Vai lá, meu filho. Mas não fica com medo, porque é na beira do rio, mas o samba é muito bom”. Eu ri, agradeci e fui pro samba. E nem imaginava que acabara de conhecer uma das grandes figuras do samba. Eu acabava de conhecer a Dona Jilçária Cruz Costa, mais conhecida nas quadras, nos terreiros, nos palcos e estúdios de gravação com a Tia Doca. Em pequena era chamada de Xandoca, Doquinha e, por fim, Doca. A Tia Doca da Velha-Guarda da Portela.
E este ano de 2012 seria um ano de festas para comemorar em 20 de dezembro os seus 80 anos. Seria, pois infelizmente Tia Doca se foi antes. Na tarde de 25 de janeiro de 2009, depois de já ter recebido alta do CTI do Hospital do IASERJ, no Centro do Rio, onde estava por ter tido um AVC, ela sofreu um infarto e não resistiu. E se foi, deixando uma lacuna difícil de ser preenchida no coração de quem a admirava e no próprio samba que era a sua vida.
Então, a hora é de lembrar desta pastora, desta partideira, que tinha orgulho em integrar
a Velha-Guarda da Portela. Mas nasceu na Rua Pescador Josino, na Serrinha. Foi morar em
Oswaldo Cruz e, casada com Altair de Araújo, filho do compositor Alvarenga, afilhado do
bamba Natal da Portela e mascote da escola, Tia Doca foi conhecer a quadra, os ensaios,
gostou e desfilou pela primeira vez no carnaval de 1953, como destaque.
Após conhecê-la naquela rápida conversa no portão de sua casa, não demorou muito para
que voltasse. Uma vez ela foi surpreendida por uma festa de aniversário. E deu a maior mão
de obra para tirá-la de casa. Mas conseguimos. E foi ali que eram realizadas as reuniões para
definir o repertório do que viria a ser o LP Raça Brasileira, que lançou Zeca Pagodinho, Jovelina Pérola Negra, Mauro Diniz, Pedrinho da Flor e Elaine Machado. Foi meu segundo disco como coordenador de produção, sob a direção de meu mestre Mílton Manhães. E, a partir deste disco, Tia Doca passou a frequentar mais os estúdios de gravação. Foi corista em disco como os de Zeca, Jovelina, Mauro, Paulinho da Viola, Dominguinhos do Estácio, Beth Carvalho e Marisa Monte, entre outros.
Tia Doca tinha a mania de colocar nome em tudo que comprava com os cachês de cada
trabalho. Em sua casa, a geladeira tinha o nome do artista do disco que gravou, por exemplo. E assim por diante. Uma jovem senhora bem sapeca, também gostava de colocar apelidos. Para minha filha Andressa, que cresceu frequentando os pagodes da nova tia, colocou 24 Horas no Ar. É que a pequena não parava quieta, fosse na Associação de Oswaldo Cruz ou no terreno da Rua João Vicente, em Madureira, onde até hoje acontece o pagode, hoje sob o comando de um de seus filhos, Nem.
O Pagode da Tia Doca, que começou em abril de 1980, passou a ser uma fonte de renda desta que foi uma das principais pastoras da Portela. Até se tornar a cantora que foi, trabalhou como fiandeira do Moinho Inglês e da Mavília, duas grandes Fábricas de Tecido. Era em seu pagode que muitos nomes representativos do samba deram seus primeiros passos, como Dudu Nobre, Zeca Pagodinho, Luis Cláudio Picolé e Márcio Vanderlei, hoje um dos principais músicos e um competente luthier, fabricando banjos. Foi no Pagode da Tia Doca que Netinho, na época do Negritude Júnior, tocou repique de mão. Que Beth Carvalho levava à loucura músicos e compositores cada vez que chegava na mesa do pagode.
Mas, bom samba à parte, que também já teve na mesa o cavaco de Jorginho Bombom e o
surdo do Tião, o charme vinha da cozinha. Vinha das enormes panelas onde ficava a famosa
sopa de ervilha, feita pela Tia Doca. Muitas e muitas vezes a sopa acabava antes mesmo do
último samba a ser cantado. Servida em copos descartáveis, a venda da sopa era responsável por filas e filas. Excelente cozinheira, Tia Doca não gostava do trivial. Por mais que também soubesse fazer um arroz com feijão, bife e batata frita, sempre preferiu as chamadas comidas pesadas, como feijoada, carne seca com abóbora, tripa á lombeira ou um bem temperado angu a baiana.
E assim Tia Doca cumpriu sua missão por aqui. Sua missão no samba, ajudando a implantar a cultura dos pagodes de fundo de quintal, junto com o Pagode do Arlindinho, na época em Cascadura, o Pagode da Beira do Rio e outros tantos que sonorizavam as noites cariocas nos anos 80 e que vem atravessando décadas e décadas. E passou o bastão para seu filho Nem, que passou a ser o responsável pelo Pagode da Tia Doca.
Marcos Salles
segunda-feira, 4 de junho de 2012
Pirulito – Um craque de elite da música
Ele já tocou com Alcione, Djavan, Ivan Lins, Dionne Warwick, Batacotô, Emílio Santiago e hoje integra a banda que acompanha Beth Carvalho. Um percussionista dos mais respeitados no mundo do samba, Luis Fernando Mattos de Oliveira já inscreveu seu nome na galeria da elite de músicos que freqüentam assiduamente os estúdios de gravação. Porém, seu nome de batismo ficou apenas para os documentos. Ainda garoto ganhou um apelido que passou a ser seu nome artístico: Pirulito. E simplesmente porque ele gostava muito do Pirulito Zorro e chegava a ter uns dez em cada bolso. Os amigos não perderam a chance e o Luis Fernando virou Pirulito. Para sempre. O artista Pirulito.
O menino peralta Pirulito, que vivia caçando rolinha no morro e quebrando vidraças na vizinhança, nasceu no Parque Proletário da Gávea e sempre teve o maior orgulho em dizer “na favela onde eu nasci”. Filho da Dona Margarida, que trabalhava num laboratório químico, e do Seu Ivino, contínuo no Palácio Guanabara, ele não teve na família um músico sequer que o inspirasse. Ou seja, trouxe a música no seu próprio sangue, quem sabe por ter nascido de frente para a Escola de Samba Aprendizes da Gávea, hoje extinta. E seu primeiro instrumento foi um reco-reco bem velhinho. Ele ficava treinando em casa, assistindo a um programa de samba, à tarde. Ao lado de sua avó, Dona Glória, que dizia que “isso não dá futuro a ninguém”. É, Dona Glória, com todo respeito à sua sabedoria, seu neto estava prevendo seu futuro. Ele estava era ensaiando a profissão que lhe deu toda a dignidade que tem hoje.
E aos poucos ele foi galgando seu espaço na música. Formou um conjunto na Cidade Alta, chamado Samba Amigo, ao mesmo tempo em que trabalhava como auxiliar de biblioteca, na PUC. De repente estava no palco, abrindo o famoso show de mulatas no Ôba-Ôba. Ele e seu não menos famoso reco-reco. Aliás, sua habilidade neste instrumento e também nas congas faz parte da marca Pirulito na música.
Tripa a lombeira, feijoada, um bem temperado tutu à mineira e outras comidas pesadas fazem parte de suas preferências. Sempre regadas a uma cervejinha gelada ou uma caipirinha ou um wískie. E, como é um músico internacional, também aprecia uma tequila e um saquê. E, junto com a fama de um competente profissional traz consigo a fama de bom contador de piadas. Isso mesmo. O tão sério pirulito é uma figuraça e tem histórias que só ele sabe contar. Pergunte a ele, por exemplo, como é a conversa de dois surfistas na praia.
Mas, piadas à parte, preste atenção em três respostas do Pirulito:
O Sucesso – O bom é subir na vida sem atropelar ninguém. É muito chato você conseguir alguma coisa botando pra lateral uma pessoa. É bem melhor você conseguir as coisas pelo seu esforço, pelo que você é.
Um Mestre – Meu amigo e irmão Mílton Manhães. Sempre me deu muita força e me ensinou muita malícia de estúdio. Me senti profissional quando entrei num estúdio, levado por ele. Foi gravando o LP do baiano Walmir Lima.
Um Sonho – Um dia chegar a ser um maestro, tipo Ivan Paulo, Rildo Hora, Leonardo Bruno. De vez em quando me imagino regendo uma orquestra de percussionistas. O dia que este sonho se realizar eu posso morrer tranqüilo.
É, Pirulito, quem sabe este momento está chegando? Mas, antes disso, sua realização já vem acontecendo com seu filho Thiago, que vem fazendo valer o velho ditado de que “filho de peixe, peixinho é”. E Thiago é um dos bons percussionistas da nova geração do samba, já tendo tocado com Arlindo Cruz, Alcione, Dudu Nobre, Pixote e atualmente no Revelação. E, de onde estiver, Dona Glória está abençoando o neto e o bisneto em suas andanças pela música.
Marcos Salles
quinta-feira, 17 de maio de 2012
Mestre do surdo
Um mestre é sempre uma referência para seus admiradores. Se no futebol temos Pelé, Garrincha, Didi, Gérson, Zico, Júnior e tantas outras lendas, no samba também posso destacar vários, mas hoje não vou lembrar de nenhum cantor ou compositor. Mas de um dos operários que participam da construção de cada um dos trabalhos, seja no estúdio ou no palco, de vários cantores. Aliás, ele não é um operário qualquer. É um artista. Para muitos, um ídolo. Escrevo hoje sobre o músico Antenor Marques Filho, o
Gordinho, o Mestre do Surdo.
E se o surdo, este instrumento de marcação, tem um sinônimo, ele se chama Gordinho, que há 40 anos vem encantando e inscrevendo com maestria seu nome na galeria dos bambas do samba, como o número 1. Chamado por inúmeros ritmistas como mestre ou professor ele traz na humildade e na pontualidade suas armas principais. E, cá pra nós, é uma verdadeira aula assistir a uma gravação quando ele está tocando. Basta olhar para seu instrumento que ele está ali ao lado, aguardando a contagem do arranjador. Muitas vezes lendo um jornal. Tocando retinho ou registrando várias de sua firulas, ele
transforma cada samba.
E, se o produtor ou o arranjador o deixa com liberdade para “brincar”, aí é que “o negócio fica sério”. Nesses momentos, ele demonstra tamanha intimidade com o surdo, que surpreende até mesmo aos que já conhecem muitas de suas artimanhas. Gordinho faz da arte de tocar, uma coisa banal,
de uma criança.
Carioca de Copacabana, mais precisamente da Ladeira dos Tabajaras, iniciou sua carreira por acaso, ao assistir a um ensaio do Conjunto Nosso Samba, no Bairro da Saúde, centro do Rio de Janeiro, no início dos anos 70. Inquieto, começou a tirar um som em um pequeno tantan, que era uma pequena barrica recoberta por uma câmara de ar. Chamou a atenção do esperto Genaro, líder do grupo, e não demorou muito para receber o convite e passar a ser um dos integrantes do Nosso Samba, que na
época comandava o samba nas noites de terça-feira, no programa de Salvador Batista, na Rádio Tupi.
A partir daí, passou a se destacar tocando seu surdo em quase todos os discos de samba, incluindo, entre muitos outros, nomes como os de Caetano Veloso, Elba Ramalho, Gilberto Gil, Maria Bethânia, Gal Costa, Simone, Daniel e ainda Dione Warwick e Paul Simon. E, de vez em quando, grava até
cantando, participando do vocal, como já aconteceu em discos de Beth Carvalho, Simone, Ney Matogrosso, das Escolas de Samba e de Bezerra da Silva. E, se não conseguiu gravar com
Elis Regina, colocou seu surdo no CD Samba Meu, de Maria Rita, filha dela.
Entre as histórias que coleciona na sua trajetória por muitos estúdios de gravação, lembro de duas que ele me contou: numa delas, teve de entrar escondido para gravar no disco de Aniceto do Império. É que, mantendo sua linha tradicional, o grande partideiro da Serrinha preferia apenas a batida do pandeiro.
Mas, ao ouvir o surdo de Gordinho, gostou. E ficou. A outra aconteceu no folclórico estúdio Hawaí, localizado nas imediações da Central do Brasil. Ele provocou o desespero do técnico de gravação quando atacou repinicando a maceta no aro do surdo. O técnico parou tudo, pensando que alguma coisa havia caído no chão. Esta, aliás, é sua marca registrada. O famoso toque no aro pode ser notado em músicas de discos do Fundo de Quintal, do Mussum, Beth Carvalho, Zeca Pagodinho e muitos outros. E
devidamente copiado por muitos músicos da nova geração.
Fora dos estúdios, ainda na época do Conjunto Nosso Samba (com Genaro, Carlinhos do cavaco, Barbosa, Stênio e Nô), acompanhou toda a carreira de Clara Nunes, em shows e gravações. Há muito considerado o número 1 do surdo, Gordinho se inspirou na classe de um dos grandes bateristas do samba, titular da banda de Chico Buarque: Wilson das Neves, seu grande ídolo. E escrever sobre Gordinho é lembrar de outros grandes músicos neste instrumento, como Nei, Bidu e Baiano (Samba
Som Sete), que já se foram. E também de outras feras que estão por aí, como Pirulito e Bira Hawaí (ele mesmo, o produtor do Molejo). Pirulito foi, durante anos, o surdo da Banda do Sol, que acompanha Alcione, e atualmente integra a banda de Beth Carvalho. Já Bira Hawai foi o srdo da primeira formação da banda de Zeca Pagodinho.
Mas, com a certeza de esquecer alguém, destaco um quinteto da pesada que sabe bem tirar um bonito som do surdo: Mestre Silvão, Carlinhos Tcha Tcha Tcha (Partideiros do Cacique), Raul André (Roda de Bamba), André Rocha (músico do Fundo de Quintal) e Walthis Zacarias. É bom prestarem atenção nestes nomes. E, da nova geração, uma mulher que tira onda. É a Renatinha, do Grupo Só Damas. É para acabar com qualquer tipo de preconceito ver a Renata tocando. Ela é um show, tamanha beleza e firmeza com que toca o instrumento.
E que todos estes e outros se espelhem na carreira de Gordinho. Afinal de contas, são 40 anos de uma folha limpa e repleta de elogios por todos os cantos. Saudade? Ele costuma dizer que sente dos tempos em que freqüentava os bailes na noite carioca. E não era tocando, mas rodando o salão no Orfeão Portugal ou na Casa do Marinheiro, entre outros clubes. É a versão de Gordinho dançarino.
Pra terminar esta homenagem ao grande músico, sua resposta, quando perguntei o dia que terminaria a carreira: “Só paro quando Deus quiser, pois toco por amor”.
É isso aí, Marquinho. Mandou bonito.
Marcos Salles
segunda-feira, 2 de abril de 2012
Carlos Evanney
Do final de janeiro de 2000 pra cá já fiz 14 cruzeiros, todos pela MSC. De Búzios, no Rio, até
o Mediterrâneo. Foram várias entrevistas com artistas e também muito samba. Mas ainda
faltava uma emoção maior. E ainda falta ir no Emoções em Alto Mar, o cruzeiro do Rei Roberto
Carlos. Mas, enquanto não embarco nesse navio, atendi o chamado da minha amiga Sueli
Barcelos, embarquei no Saveiro Mozart e fomos passear pela Baía de Guanabara e assistir ao
show de Carlos Evanney, o cover oficial do Rei. Ah, e com direito a um bom churrasco!
“Que prazer rever vocês”. É com esta saudação que Carlos Evanney, todo de branco, como
se fosse seu ídolo Roberto Carlos no seu cruzeiro, se dirige ao público após cantar Emoções,
a primeira canção do show. Mas a festa começa bem antes da apresentação deste que há
15 anos vive de imitar o Rei Roberto. A farra já se estabelece na chegada do público. E não
pense que é só a galera da terceira idade. Entre os passageiros tem os filhos e filhas também.
E os senhores e as senhoras são na verdade garotos e garotas a embarcar em mais uma farra
do cantor Carlos Evanney. A idade real fica só no RG. E todos fazem uma festa, dançando,
brincando, tirando muitas fotos.
E lá vai o saveiro, zarpando da Marina da Glória rumo à Urca. Durante o trajeto, Carlos
Evanney tira fotos com as fãs. Sua roupa? É claro que está vestindo azul, a cor preferida de
Roberto. Entre uma e outra foto, uma entrevista para o repórter Fábio Ramalho, do programa
Hoje em Dia, da Record, que realiza uma matéria especial sobre o passeio. E passa o Aeroporto
Santos Dumont, a Ilha Fiscal, a Ponte Rio-Niterói, o Museu de Arte Contemporânea de Niterói
(aquele que mais parece um disco voador) e é chegada a hora do churrasquinho, servido na
bandeja.
Até que chegamos à Urca. Vemos o Cassino da Urca, o Pão de Açúcar, o Corcovado e o prédio
onde mora o Rei Roberto Carlos. É jogada a âncora e o saveiro fica por ali, enquanto o artista
vai para o camarim. Na popa o cenário já está pronto. Ao invés do tele-pronter com as letras
para o Roberto Carlos está uma estante com uma pasta e as mesmas letras para Carlos
Evanney. Servem para que Roberto em seu transatlântico e Carlos em seu saveiro, lembrarem
das músicas. Aguardando cantor estão o guitarrista Kleber Mattos e o tecladista Tony.
E o momento tão esperado acontece. Para a alegria dos fãs com suas máquinas digitais e
seus celulares e rádios. É ele que surge! É Carlos Evanney que sobe para o convés trajando
uma roupa de comandante, parecida com a que Roberto usa em seu cruzeiro. E olha que ele
se parece com Roberto, hein! Estudioso, presta atenção a cada detalhe do ídolo! Os gestos
são idênticos e o mais distraído até se confunde.
No repertório, o melhor dos sucessos do Rei. E tem Outra Vez, Eu sou Terrível, É Proibido Fumar, Esqueça, Calhambeque, É Preciso Saber Viver e tantas outras que o público canta junto com ele. Ah, e teve até uma participação especial. A festeira Sueli passa por mim e diz: “Ele me chamou, eu vou lá”. Cá pra nós, eu não ouvi este chamado, mas valeu a participação. Sueli fez uma performance na música Negro Gato, fingindo arranhar o cantor\ e foi aplaudida.
Parte do show acontece em frente ao prédio de Roberto Carlos. Será que ele ouviu? Até que
seria uma boa idéia num desses eventos o próprio Roberto Carlos aparecer na janela! Ou
quem sabe ir até o saveiro dar uma canja com seu cover Carlos Evanney. Enquanto isso não
rola, vamos aguardar o próximo saveiro. Este foi o nono. Ah, e no final teve as tradicionais
rosas para as fãs. Foram tantas emoções...
Marcos Salles
segunda-feira, 26 de março de 2012
Chico Anysio
Meu último papo com o Mestre do Humor – PARTE I
Foi no dia 21 de dezembro de 1999 que foi publicada na revista Chiques & Famosos a minha última entrevista com o mestre Chico Anysio. E foi especial, pois fui com minha filha Andressa.
De lá pra cá não nos vimos mais. Porém, desde que o conheci, em 1982, o entrevistei umas vinte vezes, fora os papos rápidos de corredor e camarim, na cobertura que eu fazia da Escolinha do Professor Raimundo, no Estúdio de Renato Aragão.
Ele é o criador de Professor Raimundo, Alberto Roberto, Painho, Azambuja, Pantaleão, Salomé, Roberval Taylor e mais de 200 personagens que formam a família de maior sucesso no humor da televisão brasileira.
Neste nosso último encontro ele estava com 68 anos de idade, 52 de profissão e 47 de TV. E continuava o mesmo. Apesar de nunca ter tido paciência em posar para uma máquina fotográfica e assumir essa aversão às fotos, sempre foi um bom papo.
Esse mestre, esse gênio, que também foi diretor, redator, compositor, escritor, pintor e comentarista esportivo, entre outras atividades, tinha acabado de se recuperar do acidente que sofreu na piscina de sua casa.
Começo aqui, então, mais uma série, com o melhor do que ele me disse nesta entrevista.
A CURA PELA FÉ – Foi o Frei Luis quem me curou. Está tudo bem, falo até farofa. A Alcione (Mazzeo, sua ex-mulher) me chamou, pois eu já tinha tirado uma hérnia umbilical lá mesmo.
SEM O TRATAMENTO NOS EUA – Tinha a opinião da doutora de Orlando e do médico de Nova York, um ensinando exercícios e o outro uma fisioterapia de choques. Não fiz nenhum dos dois.
A OPERAÇÃO – Deitei numa cama, olhando para uma luz bem azul e dormi. Quando acordei, ele estava mexendo no meu queixo e disse que estaria bom em três meses. Voltei para Nova York e um dia, no meio de um show, na Broadway, me assustei ao lembrar que estava fazendo três meses do dia que tinha ido ao Frei Luiz. E nem havia percebido que estava bom.
SE COSTUMA REZAR – Não rezo, não.
MAS ACREDITA EM DEUS – Ele está dentro de mim. Se não acreditasse, eu não viveria.
COM SEIS CASAMENTOS, UM ROMÂNTICO – Não sei se sou romântico, pois sou da época que o romantismo estava em baixa. Porque sempre trabalhei muito. Quinze dias depois de estrear na rádio, já tinha quatro profissões. Era radioator, redator, locutor e comentarista esportivo. Nunca tive sábados, domingos ou feriados, ou seja, perde-se muito tempo para o romantismo.
O QUE FEZ PARA CONQUISTAR ESTAS MULHERES – Sempre fui muito legal com essas mulheres todas. Eu tenho muito respeito pelas mulheres. Acho a mulher um ser inteligente, que conquista o homem e dá a ele a impressão de que ele a conquistou. A mulher sabe o que está fazendo.
AS MULHERES COMANDAM – É lógico que elas que comandam. Não vou discutir com elas. Não tenho competência para isso.
O QUE É “SER LEGAL” COM AS MULHERES – Em tudo. Eu as trato muito bem e todas elas gostam muito de mim. Mesmo as ex. Eu fui cortado por quatro das cinco ex-mulheres. Somente a Zélia eu cortei. O único casamento que terminei foi o da Zélia. E sempre falo que quem não viver comigo não vive com ninguém.
PORQUE ESSA TEORIA – Nenhuma delas se casou de novo, não é? Sabe por que? Não é fácil encontrar um cara igual a mim, que não reclama de coisa nenhuma, que não cobra nada e que faz tudo o que é possível do que elas querem. Eu sou do bem, sou boa praça.
É, Chico, você era mesmo um boa praça. E semana que vem eu continuo com esse nosso
último papo. Descanse em paz...
Marcos Salles
terça-feira, 20 de março de 2012
A Bronca do Samba
Tudo ia muito bem na participação de Zeca Pagodinho no programa Domingão do Faustão,
neste domingo que passou, dia 18 de março de 2012, que marcava o lançamento do DVD
Quintal do Pagodinho.
Tudo ia bem, até que Fausto Silva foi falar com o cantor e compositor Nelson Rufino e chamou o samba de “sambão”. Sem pensar muito, rápido como o herói The Flash, o bom baiano olhou sério para o apresentador e o corrigiu em cima: “samba”, disse como se estivesse passando um pito, um carão, dando uma bronca no filho. A conversa continuou como se nada tivesse acontecido, porém, serviu como um alerta e muitos perceberam.
Por ter sempre recebido muito bem os sambistas em seus programas, desde o
Perdidos na Noite, que fez na Band, principalmente Zeca Pagodinho, não acredito que Faustão
tenha falado “sambão” num tom de deboche. Até porque, chamar samba de sambão ou sambinha já se tornou comum.
É claro que eu, Nelson Rufino e acredito que quase todos os sambistas não aprovem estes
apelidos, muitas vezes usados para diminuir o nosso samba, fonte de renda de muitas famílias
e produto de exportação de nosso país. Onde o samba vai, fora do país, é reverenciado por todos, por ser um ritmo contagiante.
A bronca de Nelson Rufino vale para que se respeite mais o samba. E o baiano Nelson Rufino fala com a autoridade de ser um dos bambas, um dos grandes nomes deste inigualável gênero musical. Na sua tranqüilidade, na sua voz macia, no seu jeitão bem baiano de ser, Nelson é compositor, muitas vezes sozinho, outras vezes com parceiros, de vários sucessos, como por exemplo, Todo Menino é um Rei, Vazio, gravados por Roberto Ribeiro e Verdade, Dono da Dor, Se Tivesse Dó e Gota de Esperança, gravado pelo Zeca, entre inúmeros outros.
Do alto de seus quase 70 anos de vida e quase 50 de samba, Nelson falou com a autoridade
de quem conhece e que merece respeito. E infelizmente o samba ainda não tem o respeito
que merece.
Volto a dizer que não acredito que Fausto Silva tenha falado com desdém. Não acredito mesmo. Mas que valeu a chamada do Nelson, isso valeu. Que sirva de incentivo para todos os que vivem e trabalham com o samba, seja cantor, músico, compositor, produtor, diretor, técnico.
Que todos tenham cada vez mais orgulho deste gênero musical que já apanhou da polícia, foi expulso dos bares e hoje é sinônimo de renda e muito lucro para muitos. O que seria da Lapa sem o bom samba? Valeu Nelson Rufino, o samba agradece...
Marcos Salles
terça-feira, 6 de março de 2012
O Samba Dita o Compasso em Alto-Mar
Na semana seguinte ao carnaval estive à frente de um evento
chamado Apoteose do Samba, realizado num cruzeiro temático do transatlântico
MSC Musica. Indicado pela Adriana Barbosa, diretora de Marketing da MSC, fui
convidado pelo competente Cassio Spina, coordenador dos cruzeiros temáticos e
criei a programação deste Apoteose do Samba. Preferi não seguir a linha dos
shows com vários ritmos brasileiros, muitas danças e saí das cenas com
pandeiros rodados na ponta do dedo e da famosa pirâmide de ritmistas para
entrar em alguns temas e homenagear o próprio samba. Ou seja, unindo o bom
samba e a boa informação. E para isso montei um time de feras, entre músicos e
dançarinas.
Então, para começar a contar como foi este cruzeiro de
samba, vou nos nomes da equipe. Além de dirigir todo este povo, fui cantando ao
lado de uma fera. Falo de Richachs, o nosso Pavaroti do Sambódromo e sucesso
das noites de segunda no Carioca da Gema, aqui na Lapa, há vários anos. Na
harmonia, a dupla do Samba com Atitude, Perninha no cavaco e Roberto Chamma no
violão. E os dois também cantaram. Na percussão, sete craques: Alex Almeida,
Waltis Zacarias, Rafael Chaves, Bidu Campeche e as revelações Bruno Criolinho e
Fernando Chaves. Faltou um nome? De propósito. Ela é uma dama. Toca sua cuíca com
graça, manha e ainda canta bonito. Falo de Carol Sant`Anna. A menina parecia
uma veterana e arrasou. Aliás, estávamos muito bem na parte feminina, pois além
da Carol, tivemos as passistas Juliana Siruffo, Elisângela Hani e Dandan, além
de Ana Chantel e Nátila, como destaques.
Foram quatro apresentações. Na primeira, Lição de Samba – O
Musical. Uma sala de aula em que as matérias são os grandes sambas enredo, os
chamados históricos. Uma escolinha muito divertida em que mostramos que também
se pode estudar através de vários sambas enredo. Além dos sambas, executados
naquela boa cadência, sem a correria dos últimos anos, uma sala de aula onde
acontece de tudo, desde o aluno que chega atrasado à aluna CDF perseguida pelos
colegas ou a gostosa protegida pelo professor. Em cena, músicos que já nasceram
atores. Todos estes acima citados. E os mais saidinhos, como por exemplo, os
figuraças Alex Almeida, Fernando Chaves, Bidu Campeche e o Richachs.
O segundo show foi Uma Homenagem à Velha-Guarda, aos grandes
mestres que abriram as portas para nós que hoje trilhamos o caminho de nossas
vidas com o samba. Mestres como Donga, Cartola, Nélson Cavaquinho, Candeia,
Noel Rosa e o pai da Bossa Nova, Tom Jobim. Ué, Tom Jobim? Claro, pois ele
próprio afirmava que Bossa Nova era samba. Entendeu? Bossa Nova é samba. Todos
impecavelmente trajados, uma percussão educada, mesmo com sete músicos largando
a mão. Mas na disciplina, na maciota. Eu, Richachs, Roberto Chamma e Carol
cantávamos estas preciosidades. E, malandramente, guardei o clássico Gago
Apaixonado, do gênio Noel, para mim. E faturei um montão de aplausos e gritos,
né? Entre os sambas, eu contava curiosidades destes mestres. E ainda tivemos um
desafio de cuícas entre Carol, Bidu e Waltis. Um show. Destaque também para a
Juliana, a Dandan e a Elisângela. Lindas em seus vestidos, bailavam com os
passageiros pelo salão, como nas antigas gafieiras.
No final Uma Homenagem ao Cacique de Ramos com uma boa roda
de samba em volta de uma mesa, numa das piscinas do navio. Sou suspeito para
dizer se foi bom. É melhor perguntar ao povo que não parava de cantar, dizer
miudinho no pé e gritar para que o pagode não terminasse. Bom assim, né?
Mas foi a terceira parte que resultou numa explosão de
emoções. Foi formada uma bateria com 80 passageiros do Musica. O detalhe é que
quase todos esses nunca haviam chegado perto de um surdo, uma caixa, um
repinique, um tamborim ou um chocalho sequer. E tocaram lindamente. E teve até um
naipe de ousadias. Teve convenção, paradinha, paradona e até batida funk. Tudo
isso após uma aula de apenas 1h45min com a nossa rapaziada. Foi assim, na
paciência, no jeito, na manha, que Rafael, Bidu, Waltis, Fernando, Criolinho,
Carol e Alex, deixaram homens e mulheres, senhores, senhoras e uma menina de
apenas 12 anos, tocarem com beleza, firmeza, maestria. Como se já soubessem.
Foi emocionante, ao fim deste carnaval, receber os agradecimentos dos
integrantes da bateria. Como uma senhora que convenci a entrar para a aula e no
fim, ela me disse: “muito obrigado por este momento único em minha vida. Estou
feliz!”. Bacana, né?
Foram cinco dias de alegria, com paradas na praia de Porto
Belo ou nas cachoeiras de Ilha Bela. E muito samba fora do roteiro como os
pagodes noturnos na piscina ou o que teve na lancha, na volta de Ilha Bela. E
ficam os agradecimentos à equipe de produção que nos ajudou muito. A Regina
Spina, a Tata, o Sílvio, time do Cassio. Ao Stevie Basketeiro, que nos
emprestou sua cobertura para os ensaios. À Ludmilla Aquino, que emprestou sua
bela fantasia da Imperatriz Leopoldinense. Um agradecimento à parte ao meu
time. Estes músicos arrebentaram no profissionalismo e os atrasos foram poucos,
até porque esta lenda viva de que músico atrasar é normal, tem de acabar. O
relógio é o mesmo para todos e o profissionalismo, o comprometimento também.
Tanto nos ensaios quanto nos palcos.
Deixei para o final a parte engraçada. Teve um que me
perguntou se teria cama pra todo mundo, mas não conto o nome. Outro queria
levar toalha de casa e também guardo o nome, hehehe! Mas algumas boas posso
contar:
Bidu – Sempre ele, este folclórico personagem. Cheio de
disposição ele foi pra lojinha. Ela estava fechada e resolveu então dar um
mergulho numa das piscinas. E mergulhou. Com o dinheiro no bolso. Teve que
secar depois, né? E as notas voando na cabine! Ah, Bidu!
Richachs – Na hora de cobrar as bebidas no primeiro jantar
no restaurante o engraçado garçom Yoga ia lá dentro e voltava, pois a conta não
batia. Ele olhava pro Richachs e voltava. Até que tomou coragem e apontou pra
ele: “Falta, Gordon!”
Alex Almeida – Ficou devendo o salto mortal na cachoeira em
Ilha Bela. Mas o salto acabou acontecendo a bordo, quando foi equilibrar o
pandeiro no dedo, se desequilibrou e foi ao chão.
Roberto Chamma – Ganhou como lembrança, inúmeras picadas de
mosquito da cachoeira.
Waltis – Foi eleito o dançarino de funk revelação. Quebrou
tudo na boate, em várias velocidades.
Se alguém se lembrar de mais alguma me conta. E até a
próxima viagem...
segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012
Carnaval
A Folia se foi e ficam as lembranças e as polêmicas
O carnaval acabou. Bem que poderia ser um pouquinho maior, como pedem os baianos. Mas a
folia se foi. E, pelo caminho ficam confetes, serpentinas, máscaras, fantasias, ilusões, alegrias,
amores de carnaval, imagens marcantes que não saem da memória e as polêmicas novas
ou antigas. Tanto faz. O bom mesmo é que o bate-boca continua por um bom tempo. Nas
esquinas, nos bares, nas mesas de jogo, na sala de casa, no trabalho, na boa farra de amigos.
E vou deixar por aqui algumas dessas lembranças. As boas e as péssimas, sempre no intuito de
que possam melhorar e ano que vem entrarem no rol das boas.
Então, vale a velha pergunta. Tenho duas notícias, uma boa e uma ruim. Qual deseja saber
primeiro? Ah, vamos logo nas ruins, para terminarmos nossa conversa nas boas. Vamos então
à parte podre do carnaval de 2012:
É claro que a invasão da área de apuração no Carnaval de São Paulo ou a polêmica no Grupo
de Acesso aqui no Rio, em que o Presidente da Lesga (Liga das Escolas de Samba do Grupo de
Acesso) é também o Presidente Inocentes de Belford Roxo, campeã deste ano, e também o
atraso na entrega das frisas no Sambódromo do Rio, ou a prisão de muitos mijões e mijonas é
péssimo para o carnaval. Tanto a invasão em São Paulo, quanto este título aqui no Rio, ainda
vão dar muita confusão. E tomara que tudo se resolva. Como também espero que se resolva
uma das piores partes deste carnaval de 2012, uma cópia do que aconteceu em 2011. Uma
queixa minha e de muitos telespectadores que assistiram à transmissão dos desfiles do Grupo
Especial pela TV Globo. Mas de muitos mesmo. E vou avisando que não faço parte daquele
grupo que odeia a TV Globo. Gosto da TV Globo, do seu nível de qualidade, das novelas, do
jornalismo, do esporte, do humor. Porém, desde o ano passado que a transmissão está o caos.
As redes sociais bombaram em comentários dos mais cruéis. Porém, verdadeiros. Como por
exemplo, referências à coleção de chapéus da Fernandinha Abreu. Já as suas opiniões...
O samba merece muito mais respeito. Ainda mais nos dias de sua festa nobre, que é somente
a maior do mundo. Portanto, a transmissão dos desfiles deve ser feita por uma equipe com
bagagem musical e que conheça os sambistas e as manhas de um carnaval, das escolas. E
o pior da história é que a Globo já teve uma equipe assim. Por onde andam feras como os
carnavalescos Fernando Pamplona, Maria Augusta e Mílton Cunha que não são chamados?
Cadê, por exemplo, Leci Brandão e Jorge Aragão? Porque não chamam o Arlindinho Cruz,
atualmente tão íntimo da emissora? Os que chamavam a Leci de Rainha da Comunidade, por
conhecer cada integrante que aparecia no vídeo, devem estar desesperados gritando pela
volta dela.
Com todo o respeito à carreira esportiva da Glenda Koslowski e do Luis Roberto, à trajetória
musical da Fernanda Abreu e da Teresa Cristina e à carreira artística do Eri Johnson, não foi
legal. Faltou conhecimento, tarimba. Faltou berço, tempo de estrada no samba e no carnaval.
Foi péssimo, por exemplo, ouvir a Glenda chamar a Beth Carvalho de Betty Faria. Por mais
que tenha sido um erro normal, mas depois de tantos, ninguém perdoou. E aí, toma-lhe
narrações profundas sobre os enredos, deixando claro que estavam lendo. E vem o repórter
Fábio Júdice com perguntas ótimas, como quando quis saber de um integrante da União da
Ilha a semelhança entre Brasil e Inglaterra. Ou a Teresa Cristina dizer que determinada escola
desfilou sem pretensão nenhuma. Como isso? Acredito que todas entram pra vencer, mesmo,
nunca tendo vencido. Ou não foi assim com a Beija-Flor em 1976, da Vila Isabel em 1998,
da Estácio de Sá em 1992, Viradouro em 1997? Lembram? Ninguém esperava, foram lá e
faturaram.
Bem, é isso. Que ano que vem o samba tenha uma transmissão de acordo com a sua grandeza.
E que a TV Globo faça um trabalho de acordo com a sua grandeza de uma das melhores do
mundo.
Mas vamos à parte bacana. Às imagens que vão ficar em nossa memória no carnaval carioca.
Separei algumas. Será que acertei? Com certeza devo ter errado, pois muito mais estão já
guardadas em nossa memória:
- Os blocos nas ruas do Rio de Janeiro. Sempre lotados e animados.
- Mais uma vez as surpresas do Mago Paulo Barros, desta vez reconhecida pelos jurados,
resultando em mais um título pra Unidos da Tijuca. Como esquecer a Comissão de Frente e
suas sanfonas, reforçada este ano pela genial sanfonheca? Ou o carro do mercado e uma ala
toda em barro?
- Os músicos internacionais Armandinho Marçal, Jovi Jovinano, Zero e Robertinho Silva e seus
filhos Vanderlei e Ronaldo Silva, e seus atabaques na bateria da Portela. Ainda na azul e branco
de Madureira, os tambores do Olodum iluminados no carro de Daniela Mercury.
- As Rainhas Sheron Menezes, da Portela, e Viviane Araújo, do Salgueiro. Sheron com o agogô
e Viviane com seu tamborim.
- A homenagem da Beija-Flor ao gênio Joãosinho Trinta na imagem de Jesus Cristo, o trono
onde ele desfilaria, vazio, com as roupas que iria usar, o bumba meu boi soltando fumaça pelas
narinas e a ala do mercado.
- A savana da comissão de frente e o filho nas costas da porta-bandeira da Vila Isabel.
- A tigreza amamentando os filhotes da Porto da Pedra.
- A bateria da Mocidade Independente de coloridos pincéis.
- O samba de Evandro Bocão, Arlindo Cruz, André Diniz, Leonel e Artur das Ferragens, na Vila
Isabel, com direito ao contra-canto, uma bossa do Arlindinho.
- O Rei Martinho da Vila homenageado na Vila, desfilando numa coroa. Perfeito.
- Maria Augusta e Renato Sorriso, como reis na União da Ilha. Reis da alegria.
- Itu Melodia soltando o grito de guerra de seu pai, o grande Haroldo Melodia; “segura a
marimba!”
- Igor Sorriso cantando máscara na São Clemente.
- O violinista Renato Sobreira tocando na paradinha da bateria.
- A alegria e irreverência da São Clemente lembrou os bons tempos da Caprichosos de Pilares.
Esta a Teresa Cristina acertou.
- A mulata do Lan, inflável, evoluindo nos ares da São Clemente, a 20 m do chão, e suspensa
por 25 cordas.
- A Estátua da Liberdade, bem à vontade, pegando um bronze na São Clemente.
- O Cristo estilizado, o couro da cuíca com desenho de Romero Brito e o choro de Mestre
Paulão, regendo sua bateria, no início do desfile da Renascer.
- A sósia da Presidente Dilma Roussef na Rocinha.
- O bumba meu boi soltando fumaça pelas narinas, a ala do mercado e o trono onde desfilaria
Joãosinho Trinta vazio, com as roupas dele.
- O samba de Jeferson Lima, Ribamar, Alexandre D´Mendes, Cristovão Luis e Tuninho
Professor, na Imperatriz Leopoldinense. E ainda o carro da baiana fazendo o acarajé e a classe
e o carisma da eterna Luiza Brunet.
- A super-paradona da bateria da Estação Primeira de Mangueira. E o carro do pagode com
Alcione, Luizito, Dudu Nobre, Xande de Pilares, Sombrinha. E, aproveitando a deixa, para os
que ainda não sabiam, pagode é o que eles fizeram naquele carro. Uma roda de samba em
volta de uma mesa. E não um gênero musical, como muitos acham. Mas isso é assunto pra
escrever depois.
Mas vou ficando por aqui neste fim de carnaval. Quando você estiver lendo estas linhas,
estarei no navio temático MSC Musica, o Apoteose do Samba, dirigindo quatro espetáculos de
samba e cantando ao lado do grande Richachs, que vocês da Lapa conhecem tão bem. Há nos
ele está nas segundas do Carioca da Gema. Vou navegar, tchau...
Marcos Salles
quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012
Unidos da Tijuca Campeã
O Rei Roberto Carlos brilhou no Sambódromo ano passado, no campeonato da Beija-Flor.
No carnaval de 2012 a escola campeã foi a Unidos da Tijuca, que levou para a Marquês de
Sapucaí o enredo O Dia em que Toda a Realeza Desembarcou na Avenida para Coroar o Rei
Luiz do Sertão, numa homenagem a Luiz Gonzaga, que se estivesse vivo completaria 100 anos
no próximo dia 13 de dezembro. E desta vez parece que os jurados entenderam a ousadia
e a criatividade do novo mago do Sambódromo (das 40 notas, apenas oito não foram dez. E
dessas, sete foram 9,9 e uma 9,7), o carnavalesco Paulo Barros.
“Nessa viagem arretada/Lua clareia a inspiração/Vejo a realeza encantada/Com as belezas
do sertão/Chuva, sol meu olhar/Brilhou em terra distante/Ai, que visão deslumbrante, se
avexe não/Muié rendá é rendeira/E no tempero da feira/O barro, o mestre,a criação...”
Conduzida pelo vozeirão do cantor (vou na onda de Mestre Jamelão que odiava o nome de
puxador) Bruno Ribas, o cavaco de Ivinho e pelo suingue da bateria fantasiada de guardas da
volante, comandada por Mestre Casagrande, a Unidos da Tijuca começa a entrar na galeria
das favoritas de cada carnaval. E seu desfile é sempre esperado com ansiedade, por conta
das surpresas preparadas pelo Mago Paulo Barros. E, depois das mágicas na comissão de
frente com as trocas de roupa e depois com a cabeça que saía do corpo, foi a vez de Lampião
e Maria Bonita abrirem uma sanfona gigante e apresentarem a alma do instrumento do Rei do
Baião. Era o ex-ginasta romeno Ioan Veniamin evoluindo dentro de uma mola colorida. Artista
encontrado por Paulo Barros no youtube. Mais um gol da premiada comissão de frente da
escola que ainda tinha seus bailarinos entrando cada um em uma sanfona. Resultado? 4 notas
dez.
“...Mandacaru a flor do serrado/Tem xote menina nesse arrasta-pé/Oh! Meu Padim, santo
abençoado/É promessa eu pago, me guia na fé...”
E a Unidos da Tijuca, chamada carinhosamente pela galera apenas de Unidos, foi passeando
pela avenida e transformando cada pedaço da obra de Mestre Oscar Niemeyer num mágico
e carismático sertão. E veio uma ala inteira, um carro alegórico representando o mercado
de artesanato e o segundo casal de mestre-sala e porta-bandeira, Vinícius e Jackeline, como
se fossem feitos de barro. Fantástico! E no teto do mercado ainda trazia gangorras com os
cangaceiros subindo e descendo. Um show! E Luiz Gonzaga foi representado por um dos
aderecistas do barracão da escola, o paraibano Nino Vitorínio. Com a inseparável sanfona
ele veio à frente do carro em homenagem ao maior sucesso, Asa Branca. E mais surpresa: de
buracos saiam pássaros brancos batendo as asas.
“...Em cada estação a triste partida/Eu vi no cangaço Vida Severina/À margem do Chico
espantei o mal/Bordando o folclore raiz cultural/Simbora que a noite já vem, saudades do
meu São João/Respeita veio Januário, seus oito baixo, tinhoso que só/Numa serenata feliz vou
cantar/No meu pé de serra festejo ao luar/Tijuca a luz do arauto anuncia/Na carruagem da
folia, hoje tem coroação...”
E vieram os reis para coroar o Rei do Baião. Vieram o Rei Roberto Carlos (vivido pelo Casseta
Hubert), o Rei do Pop Michael Jackson, a Rainha da Inglaterra, o Papa. E vieram Geovanna e Marquinhos, o casal de mestre-sala e porta-bandeira comemorando vinte anos de parceria na
avenida, três pela Unidos. E bailaram bonito com o charme e a elegância de sempre, desde os
tempos em que bailavam pela verde e rosa.
“...A minha emoção vai te convidar/Canta, Tijuca, vem comemorar/Inté Asa Branca/Encontra o
pavão/Pra coroar o Rei do Baião”
E foi neste enredo bem brasileiro que a Unidos da Tijuca passou na avenida renovada e faturou
o título de campeã do Carnaval 2012. Agora é comemorar e começar a pensar no próximo
enredo, no próximo carnaval, pois, como dizia o poeta Cazuza, “o tempo não para”.
Ah, e durante o texto espalhei o samba-enredo do Vadinho, Josemar Manfredine, Jorge Callado e
Silas Augusto, que sacudiu a Sapucaí. Viva a Unidos da Tijuca e viva Paulo Barros, o herdeiro de
Joãosinho Trinta...
Marcos Salles
sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012
Carnaval
A Magia dos Cinco Sentidos no Carnaval
O carnaval é uma das maiores manifestações de alegria do ser humano. E nele encontramos em ação os cinco sentidos: visão, audição, olfato, tato e paladar. Entremos, por exemplo, no barracão de uma escola de samba. O lugar onde tudo se transforma. Onde cada fantasia, cada carro alegórico se tornam realidade. E cada surpresa é guardada a sete chaves.
Vamos então aos cinco sentidos no universo do carnaval?
Basta entrar num barracão para a nossa visão vislumbrar cada detalhe. As alegorias, pequenas,
gigantescas, diferentes e corriqueiras. Vemos tudo. Todas as cores. Vemos a realização de um sonho de vários meses acontecendo diante de nossos olhos. E nossa audição também está bem atenta. O som do
bater dos martelos, das furadeiras, das tesouras cortando os mais diversos tecidos. E os gritos de carnavalescos, diretores de barracão, operários, costureiras, artesãos, escultores. Tudo numa interessante mistura com o som do samba que a escola irá cantar na avenida, com todos já trabalhando com o novo hino na ponta da língua.
Pode até não parecer, mas nosso olfato também entra em ação. Sentimos o cheiro da comida das cozinheiras para alimentar todos que trabalham. E, como cabeça de carnavalesco é um carnaval à parte, também podemos sentir odores que vão do jasmim à alfazema, passando pela água de cheiro e até pelas rosas jogadas num dos carros ou da fumaça que irá dar um belo efeito com a ajuda das
luzes.
E, tanto cheiro, deixa vontade de tocar, né? É usando o tato que vamos mexendo neste paraíso de cores e formas. Tocar a leveza das plumas ou batucar na madeira de um dos carros. E até mesmo se fazer de forte e levantar uma pesada pedra, que na verdade é de isopor, em mais um artifício da ilusão que é o carnaval...
Por fim, após o trabalho, o paladar se faz presente, ao provar o tempero das cozinheiras no intervalo para o almoço e o jantar. Para os que gostam, uma purinha levanta a moral no final do serviço. E, por falar em final, os cinco sentidos também estarão na avenida, em pleno carnaval. E ver o desfile, ouvir o
samba, sentir o perfume da morena, da mulata, da negra faceira, da branca animada, bater palmas e saborear um bom churrasquinho e a vitória da escola do coração.
Marcos Salles
segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012
Dercy Gonçalves
As minhas tardes com uma jovem sapeca de 92 anos – FINAL
Encerro hoje meu encontro com Dercy Gonçalves, na entrevista que fiz para a Revista Chiques
& Famosos em setembro de 1999, quando ela tinha 92 anos. E foi mais um ensinamento
conversar com uma mulher lúcida e que falava sobre qualquer assunto sem frescura e com
a sinceridade que era uma de suas marcas. E, se você deseja saber mais sobre esta incrível
mulher que se foi no dia 19 de julho de 2008, com 101 anos de uma vida muito bem vivida, leia
o livro Dercy de Cabo a Rabo, escrito por Maria Adelaide Amaral. Mas, por enquanto, ficamos
aqui mesmo no Lá na Lapa com suas respostas sinceras. E falou abertamente sobre ter pedido
demissão da TV Globo, por estar “encostada”. E conta como saiu:
As novas comediantes – Tem uns 200 nomes que eles colocam no ar, dão programa pra ver
se pega, mas não pega nada. Elas são boas atrizes, mas não são Dercy Gonçalves. Eu não
quero dizer que elas não prestam, mas me confrontar com elas me ofende. Você pode até
apaixonado por elas, pode me odiar e gostar delas, mas não chegam aos meus pés.
Escola – Eu criei uma escola de teatro que todo mundo faz hoje. Existem poucas atrizes que
não me imitam. Já fui muito criticada, discriminada, Mas eu, como era ignorante, só sabia fazer
assim. Sempre fui pela minha intuição. Nunca tive professora de nada. Nem mãe eu tive.
O que assiste na TV – Eu vejo Ratinho, Leão, Tigre, jacaré, vejo tudo. Até Monique Evans
mostrando calcinha de madrugada numa TV a cabo. Fico horrorizada, mas vejo. Que
desmoralização está a nossa televisão.
Rescisão do contrato na Globo – Na Globo não me trataram bem. A Marluce é uma mulher
encantadora e aceitou meu pedido de rescisão muito sentida, com muita delicadeza, pedindo
mil desculpas. Mas quem apanha é que sabe se doeu. E eu é que apanhei.
Vergonha na cara – Ganhava 5 mil reais. Pedi aumento e me deram 6. Esse salário todo para
não ir lá na Globo. Qualquer um não rejeita esse ordenado. Eu rejeitei. Porque tenho muita
vergonha na minha cara. Não sou doida de rasgar dinheiro, mas não quero mais. Tenho
vergonha de ser aposentada nessas condições. Sempre fui uma estrela, a primeira figura. E
agora, ser espezinhada por pilantra? Não. Sempre fui mais do que eles. Quando vieram eu já
estava lá.
Mãe da Globo – Todos os filhos são ingratos. Todo filho quer mandar na mãe. A mãe ensina
tudo e depois ele quer ensinar à mãe aquilo que já aprendeu. E assim aconteceu na Globo.
Lá, todos podem fazer, menos eu. Se lá não pode falar palavras, como é que às 6 horas fazem
coisas que não devem? A Dercy é que não pode. Tudo bem, mas eu não sou obrigada a ficar.
A carta de demissão – Minha carta é melhor que a do Getúlio Vargas. Ninguém tem coragem
de fazer o que eu fiz. De chegar e dizer para a Rede Globo “eu não quero mais você”. Só eu.
Fiquei na história.
Marcos Salles
terça-feira, 7 de fevereiro de 2012
Dercy Gonçalves
As minhas tardes com uma jovem sapeca de 92 anos - PARTE II
Conforme o combinado, volto com a segunda parte de meu
encontro com a inesquecível Dercy Gonçalves.
A entrevista foi no seu
apartamento, na zona sul do Rio, cuja decoração lembrava os bastidores do
Teatro de Revista. Em duas araras, por exemplo, estavam penduradas inúmeras
roupas brilhantes com muito paetês e strass. Nas paredes os mais variados
pôsteres e retratos.
Mas, entre tantas lembranças familiares, a homenagem ao
grande amigo Fausto Silva. Em destaque numa mesa, logo na entrada, duas
caprichadas molduras com recortes de reportagens sobre os nascimentos de Clara,
do apresentador com Magda Colllares.
Mas vamos a mais algumas boas respostas de Dercy na
entrevista que fiz e me diverti muito. Ah, e aprendi também com esta mulher que
na época tinha 92 anos muito bem vividos.
Relação homem e mulher – Está tudo perdido. Talvez seja um
sinal do fim do século. Espero que a qualquer momento a mulher passe a se
valorizar. Falo isso porque sou do princípio do século. Peguei uma época em que
o homem cantava a mulher que ele namorava, se dedicava, mandava bilhetinhos,
flores. Infelizmente, nos dias de hoje não tem mais isso.
O Papel do homem – No meu entender, o homem tem de comandar
a mulher. É obrigação. A mulher é submissa ao homem.
A sua vaidade – Sou uma mulher vaidosa, gosto de usar coisas
bonitas.
Posar nua – Nunca houve nada disso. Brinquei com o
jornalista porque ele foi bobo. Ele me convidou para uma reportagem e eu disse
que faria fotos nua, mas queria muito dinheiro. Ele não acreditou. E se fizesse
eles que iriam faturar com isso. Antigamente o nu artístico era insinuado,
bonito, sugerido. Hoje é um esculacho, uma vergonha, uma vergonha, a mulher
mostra tudo. É horrível, uma coisa escrachada.
Nu masculino – O que é que tem o homem mostrar? Porque
discriminar? Mas eu acho que é a vergonha total.
Arrependimento – Só uma vez. Foi quando chamei o prefeito de
Madalena, minha terra, de ladrão. Ele me processou. Mas não em nada. Pedi
desculpas e nos beijamos. Porque iria ofender o homem à toa? Chamei de ladrão
porque ele roubou. Só não sabia que não podia falar. Mas não queria ofender.
Não queria deixá-lo mal com a família. Disse assim: Não, absolutamente, você
não é ladrão. Não pode falar? Então não falo!
Palavrão na hora errada – Nunca disse. Eu sei a hora certa.
Sei dizer o palavrão para você rir e não para ofendê-lo. Eu só faço o público
rir. A minha missão é essa: ver o público rir.
Uma nova Dercy Gonçalves – Ora, imagina! Existe coisa
nenhuma. Se tivesse outra Dercy, ela estaria fazendo sucesso. É só bumbum o que
mostram.
Bem, fico por aqui. Semana que vem termino de lembrar minha
entrevista com a grande Dercy Gonçalves.
Até lá!
Marcos Salles
segunda-feira, 30 de janeiro de 2012
Dercy Gonçalves
As minhas tardes com uma jovem sapeca de 92 anos - PARTE I
Dercy Gonçalves
Siqueira ainda estão em nossa mente. E toda sua irreverência, polêmica, sabedoria e ótimo
humor estão enraizadas aqui pelo centro do Rio, nos palcos onde brilhou. Ela nasceu Dolores
Costa, no dia 23 de junho de 1907, na cidade de Santa Maria Madalena, no interior do Rio de
Janeiro. Fugiu de casa aos 17 anos, adotou o nome de Dercy Gonçalves e decidir ser atriz numa
época em que a profissão não tinha glamour nenhum. Ela se foi no dia 19 de julho de 2008,
aos incríveis 101 anos de idade. Nove anos antes de sua despedida fui entrevistá-la para a
Revista Chiques & Famosos.
Bem, lá fui eu, a fotógrafa Luciana Avellar e o maquiador João Paulo Cofir para o apartamento
dela, em Copacabana. Tudo marcadinho, certinho, chegamos, fomos muito bem recebidos por
uma amiga de Dercy, que estava num outro aposento numa reunião de trabalho. Ficamos na
sala, à meia luz, ouvindo as boas histórias desta amiga (perdão, mas o nome eu bem esqueci).
Mas o tempo foi passando, um soninho foi batendo e dormi na poltrona. Acho que a Luciana
e o João Paulo também deram uma boa cochilada. Depois de sei lá quanto tempo ela aparece.
Com seu jeito despachado, nos conduziu à porta e nos colocou no elevador, dizendo “ih, hoje
não vai ter entrevista. A vida é assim, vamos gente, vamos remarcar, tchau!”. E fomos embora
chorando de rir. Não tinha como se aborrecer com a Dercy.
É claro que consegui remarcar e voltei com a Luciana e com a maquiadora Rita Fischer. O João
Paulo até hoje lamenta não ter podido ter maquiado a grande estrela. Desta vez o papo rolou
e foi uma tarde muito divertida. Com toda a sinceridade que sempre esbanjou ao longo de sua
vida, respondeu a todas as perguntas. Então, seguem algumas das boas declarações de Dercy
Gonçalves, esta mulher que não tinha medo de ser feliz:
Segredo da longevidade – Não existe. O que dizem por aí é invenção de propagandista, é
fantasia. Chegar aos 92 é coisa da vida. Eu não faço nada demais. Não pratico esportes nem
tenho alimentação cuidadosa. Vivo como fui criada. Minhas raízes são pobres, vim de uma
família humilde e continuo a mesma.
Alimentação - Como e faço tudo o que quero, tudo que tenho vontade. Nunca exagero
naquilo que posa me fazer mal ou que depois eu venha me arrepender. Gosto de rabada,
angu, lingüiça, mocotó, entre outras coisas.
Relacionamento com Deus – Não tenho nenhum relacionamento com Deus, não acredito em
nada. Que Deus? Deus sou eu. Ele é quem me deve, porque faço o que a natureza manda.
Destino – Acredito muito. O que é meu, é meu. O cara lá de cima tem disciplina, não muda o
que está escrito.
Medo da morte – Que morte o que? Isso é covardia. E eu lá vou ficar tremendo hoje? Dessa
maneira morro antes e não aproveito a vida.
Se esperava chegar a essa idade (ela tinha 92 neste dia) – Não, porque na minha época quem
fazia 30 anos já era considerado velho. Eu achava que não fosse viver nem 40 anos. Não penso
no depois de amanhã, porque não sei se chego lá. Penso só no hoje.
O que a deixa feliz – Comer é um dos meus maiores prazeres. Sabe o que gosto de receber de
presente? Dinheiro. Não compre flor para m mim. Olha aquela ali que veio outro dia. Já está
fedendo.
O que a deixa triste – Não ter o comer e ficar sem dinheiro. Tive o pior câncer, que é o de
estômago, e não fiquei triste. Liguei pro Boni (na época consultor da Rede Globo), que me
colocou no Hospital Albert Einstein, em São Paulo e eu não paguei nada. Saí do médico e fui
comprar um carro.
Ter um namorado – Uma pessoa com mais de 90 anos namora? Já namorei muito, era o que
mais gostava de fazer. Mas não era como agora. Hoje os jovens pensam em resolver tudo no
primeiro encontro. Namoro tem de ter o olhar, o esperar, o piscar, o ir dançar, o sair para
jantar. Cama é outra coisa. Namorar é muito bom. Mas hoje está impraticável. Só se fala em
sexo. E as mulheres se desmoralizaram porque elas não esperam, vão logo atacando.
Bem, vou ficando por aqui mas volto para a segunda parte desta inesquecível tarde com Dercy
Gonçalves...
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