segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Das Páginas do Samba: Saudades de Jovelina Pérola III

Com o cantor e compositor Dunga


E vou seguindo nesta série sobre a partideira Jovelina Pérola Negra, que nos deixou muito cedo. E hoje o que resta, além das gravações, são suas histórias. Divertidas passagens que entraram para o folclore do samba. E a maior delas já possui várias versões. Mas a verdadeira aconteceu mesmo aqui pertinho da Lapa, mais precisamente no Teatro João Caetano, na Praça Tirtadentes. É a famosa história do borderô.


Ela fazia uma temporada de duas semanas com o Grupo Fundo de Quintal. Os pagamentos eram feitos nas sextas, mas na terça ela já estava querendo o seu, dizendo que estava “dura igual um côco”. E lá foi procurar o coordenador, Seu Hélio. Calmamente ele disse que ia adiantar uma parte e depois colocaria o valor no “seu borderô”. Aí Jovelina fechou o tempo. E gritava pra quem quisesse ouvir: “Nãoooo. No meu borderô não. No meu borderô nem meu marido coloca”. E demorou para se acalmar e entender o que era o tal borderô. Coisas de Jovelina.

Com Leci Brandão
Aliás, “Tá brabo. Estou dura igual um côco. Tenho que ganhar um qualquer”, era um dos bordões preferidos da Jojô. E como reclamava. Jovelina não colocava sua bolsa no chão (“o dinheiro vai embora”). Durante as gravações, nossa diversão era esconder suas sandálias ou colocar sua bolsa no chão. Ela ficava uma fera, mas depois de vários palavrões todos caíam na gargalhada. Com as boas vendagens de discos e os muitos shows que fazia tratou de resolver vários sonhos, como por exemplo, a operação nos seios. Toda prosa com o novo formato, uma vez ao colocar voz num dos LPs, recebeu a visita do parceiro Zeca Pagodinho e não perdeu tempo: “Aqui, Pagodinho. Olha, olha. Está uma chupetinha, pequenininho, mas não é pro teu bico não, hein!”, gritou, mostrando os seios recém-operados.

Ela era assim. Era autêntica, uma mulher simples, do povo, humilde. Em casa, tinha a mania de lavar roupa, o que fazia muitas vezes de madrugada. Sua vida foi de sacrifício, de muita luta. E foi nessa dureza, que ela conseguia transformar em cenas engraçadas, que achou inspiração para seu primeiro grande sucesso, o samba Feirinha da Pavuna. Ela tinha ido fazer a feira na hora da xepa (em que tudo está mais barato). Saiu uma briga feia. Legumes e frutas voavam por todos os lados e, na confusão, a esperta negona pegava o que sobrava. Ao chegar em casa fez o samba, que começa assim: “Na feirinha da Pavuna houve uma grande confusão/a dona cebola que estava invocada/ela deu uma tapa no seu pimentão...”

Porém, ela nunca mudou. Sua essência de mulher humilde e lutadora para colocar o pão em casa para os filhos continuava. Lembro de um show de uma rádio FM, no Clube dos Subtenentes e Sargentos do Exército, no Rocha, no Rio. Ela era a grande atração da noite e a casa estava cheia. Mas a banda que iria acompanhá-la ainda não tinha recebido. Ela soube e disse que só entraria no palco após este pagamento e, para completar, foi até o portão, tirou o segurança da frente e abriu, deixando entrar uma pequena multidão. Aí sim, estava satisfeita e foi cantar.

Bruno Quaino, Mílvar Filho, diretores da editora Sigem e Almir Guineto

Essa era a Dona Jove, como Alcione costumava chamá-la. Semana seguinte vamos para o penúltimo capítulo desta série. Não perca, valeu?

Marcos Salles

3 comentários:

  1. Perdi a oportunidade de ver Jovelina no Teatro Rival no show de Almir Guineto, naquela noite ela ja não pode fazer a participação, motivo que havia me levado ao show. Bons tempos. Valeu Marcos, pelo texto e foto desta dama que se despediu tão cedo. José Carlos Gomes

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  2. Meu amigo Marcos Salles, não fique zangado comigo mas acabei de sentir o sentimento feio e inútil da inveja! QUe inveja de você q teve o prazer de desfrutar da convivência da JOVELINA PÉROLA NEGRA. Mas tb me recordei de um inesquecível show dela q assisti na favela do Morro Azul por volta de 1992 e depois durante toda a semana todos não parávamos de cantarolar: EU QUERO SABER QUEM FOI...QUEM FOI A VACA QUE BOTOU CHIFRE NO BOI...
    que saudade Jovelina!!!
    Forte abraço
    Lobisomem

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  3. Parabéns pelo seu trabalho, a primeira vez q a vi eu tinha 15 anos.Hojé c\ 39 continua admirando seu trabalho tenho certez q lá no outro plano ela dever deixar muitos felizes.Pois aq ela continua encantando muitos.Muita luz Jove!!!!!!!

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